terça-feira, 29 de março de 2011

Da Vida ... o Teatro!

    Mais uma usarei a 1ª pessoa, desculpe-me caros leitores!

    A juventude fez-me amar o Teatro. Aos 25 anos já tinha escrito 9 peças, cada qual com quatro atos. Aos 28 anos, somei 27 peças. O Teatro coreu no meu sangue e continua a ferver minh'alma. Peças longas, público atento, platéia envolvente.
    A primeira, batizei com o título de "Antítese". Sempre fui um paradoxo, uma antítese ... e com ela queria criar um novo teatro, um novo estilo de dramaturgia. O Grupo escolhido era composto de 16 personagens. Eu, orientado pelo grande amigo e diretor Luis Antônio, fui escolhido para atuar no papel daquele personagem que mais retratava a angústia da minha geração.

    Levamos 6 meses para os ensaios contínuos e cansativos. Não havia Domingo e nem folga alguma, além dos estudos pesados de uma Universidade sitiada pela Ditadura. Então chegou o dia! Uma noite de inverno, noite de maio.
    A platéia, em expectativa, recebeu na entrada um bilhete vermelho e outro azul. Mal sabiam o porquê!
    Vinte e uma horas, as luzes pausadamente se apagaram. A escuridão emudeceu os 320 expectadores, todos estranhos. Nenhuma luz, mas as cortinas se abriram fazendo um ruído. Ninguém no palco. O tic-tac de um relógio começou a soar e nós, como fantasmas saidos das tumbas, silenciosamente entramos em meio da própria platéia. Subí ao palco, ergui os braços e, ao som do Réquiem de Mozart, gritei: Harmonia ou Caos!
    E encenei minha primeira obra dramatúrgica!
    Foram quatro atos de atenção e tensão. Quatro atos de "Antítese". O último, todos os personagens acusavam-me por insuflar a juventude, por gerar o "maio de 68", por reverenciar Pink Floyd e cantar MPB.
Uma personagem, vestida de branco e com olhos vedados, dirige-se à platéia dizendo: Vocês é que o condenarão e nós o executaremos, por isso escolham uma cor do bilhete, não lhes direi a qual que significa condenação.
    As luzes do palco se apagaram, as cortinas se fecharam e pirilampos infiltraram-se na platéia e recolheram os bilhetes, depositando-os num baú de couro, cujo significado era o encarceramento das idéias.
    Em meio da platéia o baú foi aberto, os pirilampos simularam uma contagem e logo veio o veredicto: CULPADO!
    A reação da platéia foi inesperada! Todos reclamaram e acusaram de fraude, pois tinham escolhido unanimamente a cor azul e realmente havia 320 bilhetes azuis. Mas, a cortina se abriu e o corpo do principal personagem já se encontrava inerte sobre uma mesa fria. Fora torturado até à morte!
    Diante do cadáver, todos os demais personagens, dirigindo-se à platéia disseram: Foram vocês que o condenaram, o torturaram e o assassinaram, pois pelo bilhete vermelho ele seria acusado de comunista e morreria e pelo azul seria acusado de traidor e também morreria. Esta é a "Antítese"!

    A peça ficou 8 meses em cena e foi ela que motivou a expressar-me também pelo Teatro!
    Influenciado pelo saudoso Mário Lago e por Bertold Brecht ainda contiuo a escrever.

    Para encerrar, transcrevo um trecho que entrou em desuso e caiu no esquecimento:

    "Existem aqueles que lutam um dia e são bons!
     Existem outros que lutam um ano e são melhores!
     Existem aqueles que lutam muitos anos e são muito bons!
     Mas existem aqueles que lutam toda a vida. Esses são os imprescindíveis!".
                                                                                                                   Bertold Brecht

    Ao encenar, expressamos o que somos e o que guardamos dentro de nós e ninguém percebe, pois é simplesmente "Teatro"!

                                                                         José Juliano 

     

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